Como seu cérebro otimiza decisões (e o que isso tem a ver com engenharia)

Como seu cérebro otimiza decisões (e o que isso tem a ver com engenharia)

Escrito por Victor do Amaral Sampaio Pinheiro

Publicado em 22/09/2025

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Todos os dias tomamos centenas de decisões: o que vestir, qual rota pegar, o que comer, quando responder uma mensagem. Grande parte dessas escolhas é feita de forma quase automática, sem que a gente perceba. Mas você já parou para pensar que seu cérebro funciona como uma pequena fábrica de decisões? E que ele, assim como uma linha de produção bem ajustada, aplica princípios semelhantes aos da Engenharia de Produção para economizar energia, tempo e recursos?

O psicólogo Daniel Kahneman, ganhador do Prêmio Nobel de Economia, popularizou a ideia de que nosso cérebro opera em dois “sistemas”: um rápido, automático e intuitivo (Sistema 1) e outro mais lento, analítico e racional (Sistema 2). O primeiro utiliza heurísticas, ou seja, atalhos mentais que permitem tomar decisões rapidamente sem analisar todos os dados. Isso é extremamente útil em um mundo onde somos bombardeados por informações e precisamos decidir com agilidade. Essa divisão não significa que um sistema é melhor que o outro, mas que cada um é mais eficiente em contextos diferentes. O Sistema 1, por exemplo, é essencial para sobrevivência em situações de urgência; já o Sistema 2 entra em ação quando é preciso tomar uma decisão complexa, como investir dinheiro ou escolher uma carreira.

E é aqui que começa a conexão com a Engenharia de Produção. Assim como uma fábrica busca otimizar recursos para produzir mais gastando menos, nosso cérebro também tenta economizar energia cognitiva. Pensar exige esforço, e nosso organismo prefere gastar esse recurso precioso apenas quando realmente precisa. Por isso, criamos rotinas mentais, padrões de comportamento e respostas automáticas para situações recorrentes. Essa espécie de padronização mental se assemelha aos procedimentos operacionais padrões (POP’s) usados em ambientes industriais, que visam reduzir erros e agilizar a produção. Quanto mais vezes fazemos algo, mais automático ele se torna. Isso explica por que é tão difícil no começo aprender uma nova habilidade, como dirigir ou cozinhar, mas depois de um tempo se torna natural.

Se observarmos com atenção nossos hábitos, podemos perceber que muitas das nossas escolhas seguem um fluxo parecido com o de uma linha de montagem. Desde o momento em que acordamos, passamos por etapas que envolvem entrada de informações (hora, clima, agenda), processamento (interpretação das condições) e saída (decisão sobre o que fazer). Esse mapeamento de processos mentais lembra o uso de fluxogramas na indústria, onde se busca entender e melhorar cada etapa de um processo produtivo. Mapear seus próprios processos internos pode ser uma estratégia interessante. Por exemplo, como você decide o que almoçar? Existe uma ordem padrão? Você considera disponibilidade, tempo, preferência ou simplesmente vai no impulso? Observar essas lógicas pessoais ajuda a identificar padrões ineficientes e aprimorar o modo como decidimos.

Outro ponto em comum é a busca pela redução de desperdícios. Na filosofia Lean, largamente utilizada na Engenharia de Produção, desperdício é tudo aquilo que consome recursos sem agregar valor. No contexto mental, isso pode significar gastar energia com decisões triviais, como escolher a roupa do dia, ou com preocupações repetitivas que não levam a lugar nenhum. Automatizar certas escolhas, como definir previamente o cardápio da semana ou usar listas de tarefas, é uma forma de eliminar esse tipo de desperdício cognitivo. Essa economia de energia mental também é importante para preservar o foco em tarefas mais complexas. Quanto menos decisões irrelevantes você tiver que tomar, mais capacidade de concentração sobra para atividades que realmente exigem sua atenção.

Outro conceito interessante que pode ser aplicado ao funcionamento mental é a Teoria das Restrições que afirma que todo sistema tem um gargalo que limita sua performance. No nosso caso, esse gargalo pode ser a falta de foco, o cansaço, a sobrecarga de informação ou mesmo a desorganização. Ao identificar esse ponto limitante e atuar sobre ele, conseguimos melhorar nossa produtividade mental. Por exemplo, se você percebe que é mais produtivo pela manhã, pode reservar esse período para tarefas mais importantes e deixar atividades mais leves para a tarde. Se você costuma se distrair com redes sociais, pode usar ferramentas de bloqueio temporário ou criar “zonas livres de distração” no ambiente de trabalho. Assim como uma empresa precisa ajustar seu processo para melhorar o desempenho global, você também pode fazer ajustes pessoais simples com grande impacto no resultado final do seu dia.

A melhoria contínua, conhecida pelo termo japonês Kaizen, também pode ser trazida para o plano pessoal. Pequenas mudanças diárias, como revisar a agenda no fim do dia, refletir sobre o que funcionou ou buscar aprender algo novo, contribuem para um processo constante de evolução. Assim como uma fábrica não se transforma de um dia para o outro, nossa mente também se aprimora pouco a pouco, através de ajustes frequentes. Isso pode incluir o hábito de anotar ideias, testar novos métodos de estudo ou organização e pedir feedback sincero de colegas e amigos. Pequenas melhorias acumuladas diariamente geram grandes transformações no longo prazo.

Em resumo, pensar com mais inteligência não é apenas pensar mais. É pensar melhor. E para isso, podemos aprender muito com os princípios da Engenharia de Produção. Ao entender como nosso cérebro funciona, conseguimos projetar rotinas mais eficientes, tomar decisões mais acertadas e lidar melhor com os desafios do dia a dia. Nós somos, em certa medida, os engenheiros da nossa própria mente. E ao aplicar essas ferramentas mentais de maneira consciente, podemos construir uma vida mais leve, organizada e produtiva. Pensar como um engenheiro não é restrito às fábricas. Pode ser uma estratégia poderosa para viver com mais intencionalidade, foco e bem-estar.